Desafios do crescimento empresarial: as dores mais comuns

Gestão 26/06/2025

“Tem muita empresa boa que cresce e tropeça no próprio crescimento. Como se não tivesse pernas para caminhar no novo tamanho que alcançou. Como se as dores de crescimento superassem a energia para evoluir.”

Essa frase, dita pela minha sócia Camila Carvalho em uma de nossas conversas, traduz um fenômeno comum, mas muitas vezes invisível nas pequenas e médias empresas em expansão: as dores do crescimento.

Essas dores não são meras falhas ou defeitos da gestão. São os efeitos colaterais naturais do sucesso. Surgem quando a estrutura que sustentou o negócio até aqui já não dá mais conta do que ele precisa ser daqui para frente. É como uma planta que cresceu demais para o vaso em que foi colocada: o crescimento exige um novo recipiente e, na empresa, esse recipiente são as estruturas, os processos, a liderança, a governança.

O desafio, portanto, não é o crescimento em si, mas a capacidade da empresa de se reorganizar para sustentar esse crescimento com saúde e consistência.

Por que as dores aparecem?

Quando uma empresa nasce, ela opera majoritariamente sobre três pilares muito básicos:

  • A energia e o conhecimento dos fundadores;
  • As primeiras vendas e clientes conquistados;
  • A proximidade e a informalidade nos processos internos.

Nesse estágio, o improviso e a flexibilidade são vantagens competitivas. Mas, à medida que o volume de clientes aumenta, as equipes crescem, e as demandas se multiplicam, o que era força vira risco.

Clayton Christensen, autor da teoria da inovação disruptiva, ajuda a iluminar esse tema com seu modelo dos Recursos, Processos e Valores (RPV). Segundo ele, toda organização opera com base nesses três elementos:

  • Recursos: as pessoas, tecnologias, ativos e capital que movem a empresa;
  • Processos: os métodos e rotinas que transformam recursos em resultados;
  • Valores: os princípios que guiam as decisões e priorizações.

Conforme a empresa cresce, a relação entre esses três elementos muda. Um negócio pequeno depende fortemente dos recursos (do trabalho do fundador, dos primeiros clientes, da equipe reduzida). Com o tempo, precisa criar processos robustos para sustentar o crescimento e dar conta do aumento da complexidade oriunda do aumento do número de clientes e funcionários, por exemplo. E, à medida que amadurece, os valores organizacionais tornam-se fundamentais para garantir coerência e alinhamento nas decisões e permitir que a empresa ganhe vida própria.

As dores de crescimento surgem quando esses três elementos deixam de se alinhar com a nova realidade do negócio. O que antes funcionava começa a emperrar.

Várias estatísticas mostram essa realidade no Brasil, por exemplo, o SEBRAE tem alertado há anos para o risco dessa transição. Segundo levantamento da instituição cerca de 60% das empresas não sobrevivem após 5 anos de vida. As taxas de mortalidade aumentam justamente no momento de transição do pequeno para o médio porte. E entre os principais motivos apontados estão a falta de planejamento, dificuldade de gestão e ausência de processos estruturados.

Ou seja: não é o mercado desafiador que mais mata empresas, mas a própria falta de sustentação interna para lidar com o crescimento no decorrer dos anos. E, além disso, a compreensão de que a cada estágio de crescimento, surge um novo desequilíbrio e novas coisas para aprender e desaprender como empresa e liderança.

Mas o que são, na prática, as dores de crescimento?

São os sinais de que algo precisa mudar para que o crescimento não vire um peso insustentável. Alguns sintomas comuns:

  • Lideranças sobrecarregadas ou centralizadoras, incapazes de delegar;
  • Retrabalho constante e processos “na cabeça das pessoas”;
  • Aumento de ruídos na comunicação e decisões nebulosas;
  • Clientes reclamando porque os processos que atendiam 50 já não dão conta de 500;
  • Morosidade para decidir, ou o oposto: decisões no improviso, feitas no grito.

Esses sinais, se não mapeados, vão truncando o crescimento, mesmo quando os resultados financeiros ainda aparecem. É o tipo de problema que não impede de avançar, mas faz avançar com mais esforço, mais desgaste e menos potencial realizado. E, claro, se não solucionados, podem travar de uma vez o negócio em algum momento.

Um estudo da McKinsey identificou que 80% das empresas que crescem rápido sem revisar suas estruturas internas enfrentam quedas relevantes de produtividade, clima organizacional e retenção de talentos em até 3 anos. Crescer sem revisar processos e lideranças é carregar para o próximo estágio os mesmos problemas ampliados.

Em outro artigo, abordamos o termo entropia cultural, que se refere a uma condição organizacional onde o gasto de energia das pessoas para lidar com os entraves e desgastes da estrutura são maiores do que com o trabalho em si. Um termo de análise de cultura, que vale a pena compreender. Para ler, clique aqui e aprofunde neste tema também.

E os dados que temos visto em nossos próprios diagnósticos na Consense, durante nossos 10 anos de atuação, reforçam essa mesma leitura. Em uma análise recente realizada a partir dos mais de 70 que passaram por nosso diagnóstico organizacional na última década, analisamos as principais dores levantadas nessas empresas:

75% das empresas analisadas apresentam falta de clareza sobre papéis e responsabilidades.

68,8%, sofrem com centralização excessiva de sócios ou lideranças.62,5% não possuem processos estruturados de forma alinhada com o momento da empresa.56,3% apresenta culturas paternalistas e com baixo nível de responsabilização.

Esses números não são exceção. São um padrão percebido ao analisar uma linha do tempo extensa de análises em negócios de diversos segmentos e tamanhos. Levantamos respostas oriundas de mais de 4500 pessoas em nossas pesquisas quantitativas e qualitativas. O Estudo Consense 10 anos já está disponível para download gratuito. Faça o download aqui.

Alguns sinais costumam se repetir, mesmo em setores distintos:

  • Lideranças sobrecarregadas e centralizadoras: os sócios seguem sendo o centro de quase todas as decisões relevantes, o que gera um funil decisório insustentável.
  • Processos informais, baseados na memória das pessoas: tudo flui enquanto a empresa é pequena, mas se torna caótico quando o volume cresce.
  • Comunicação truncada entre áreas: sem processos claros, a informação começa a circular mal, e as áreas passam a operar com visões desalinhadas.
  • Ruídos de clima organizacional: surgem conflitos velados, falta de responsabilização e dificuldades em dar feedbacks maduros.
  • Descompasso entre discurso estratégico e prática operacional: muitas empresas falam em inovação, crescimento e propósito, mas o cotidiano é dominado por urgências operacionais.

Nem toda dor é dor de crescimento

É importante diferenciar: nem todo incômodo é resultado do crescimento. Existem dores que vêm da ineficiência, da cultura tóxica, da má gestão. As dores de crescimento são desconfortos que surgem a partir da expansão, da transição para um novo patamar. É a planta que precisa de um vaso maior. Já dores oriundas de negligência ou rigidez são mais parecidas com uma planta murchando por falta de cuidado.

Por exemplo: uma empresa familiar de médio porte com a qual trabalhamos estava enfrentando alta de confrontos entre times e aumento de reclamações de clientes. A leitura inicial era de problemas de “comunicação” entre as áreas. Ao investigar mais a fundo, identificamos que o crescimento da empresa tinha tornado os processos obsoletos, as lideranças médias não tinham clareza de autonomia e o fundador continuava centralizando decisões estratégicas. A dor não estava na comunicação em si estava nas estruturas que não acompanharam o crescimento.

Por outro lado, dores oriundas de lideranças tóxicas, de descuidos com clima organizacional, ou de má gestão financeira crônica são dores de outra natureza. Ignorar essa diferença faz com que empresas invistam em treinamentos pontuais ou medidas superficiais, sem atacar a raiz do problema.

Como lidar com as dores de crescimento?

As dores de crescimento são inevitáveis, pois são um convite ao próximo estágio. Um convite para a empresa se reorganizar, amadurecer, expandir sua consciência de gestão. Ignorar esses sinais, no entanto, cobra um preço alto: desgaste humano, perda de eficiência, desperdício de energia e, em alguns casos, comprometimento da própria continuidade do negócio.

Por outro lado, encarar essas dores como convites ao amadurecimento permite transformar o desconforto em aprendizado estratégico.

Em nosso Estudo Especial sobre Dores de Crescimento em PMEs, recém-lançado em comemoração aos 10 anos da Consense, buscamos justamente aprofundar esses achados a partir de dados concretos coletados em dezenas de organizações brasileiras. Se quiser aprofundar, faça o download gratuito do nosso ebook sobre dores de crescimento.

Algumas recomendações para lidar melhor com as dores de crescimento:

  1. Mapeie os sintomas: retrabalho, perda de talentos, ruídos constantes entre áreas, centralização excessiva são sinais a observar;
  2. Conecte os pontos: evite enxergar os problemas como “pedaços isolados”. Olhe para o sistema. Um problema no comercial pode ter origem na operação. Um conflito entre áreas pode nascer de uma ausência de processos claros;
  3. Revisite os processos, recursos e valores: avalie se a empresa está operando com as ferramentas, métodos e princípios certos para o tamanho e complexidade atuais;
  4. Prepare a liderança: muitas dores de crescimento são sustentadas por lideranças que não se transformam no mesmo ritmo da empresa. Investir no desenvolvimento de liderança é investir na sustentação do crescimento;
  5. Aceite o processo evolutivo: não existe “lugar de chegada” no crescimento organizacional. Cada novo patamar exige novas lentes, novas estruturas, novas decisões.

E talvez a maior lição seja a de que crescer não é só expandir economicamente, mas também amadurecer como negócio. E assim como acontece com a gente, seres humanos, amadurecer dói e gera desconforto, mas é gratificante e realizador. Lidar com as dores do crescimento é construir, em paralelo ao crescimento, a capacidade de sustentá-lo por mais tempo.

Fica aqui o convite para quem deseja mergulhar ainda mais nesse tema, o Estudo Consense 10 anos já está disponível para download gratuito, faça o download aqui.

 

Anderson Siqueira é CEO e fundador da Consense, especialista em desenvolvimento organizacional e cultura corporativa.

 

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