Qual o segredo das empresas que duram? 50 anos do Contábil Comodo

Governança 04/09/2025

Não poderia haver lugar melhor para essa pergunta do que numa celebração de 50 anos. A longevidade de uma empresa é rara, preciosa e merece ser compreendida.

Na semana passada, participei de um evento muito especial: a celebração de 50 anos do Contábil Comodo, escritório que cuida da contabilidade da Consense e que foi comandado por uma grande amiga, Soraia Comodo. O episódio me fez resgatar um pouco dos meus aprendizados sobre evolução e longevidade organizacionais, conhecimento nascido das minhas vivências nestes quase 15 anos de atuação com consultoria e treinamentos.

Registro da minha palestra no evento de 50 anos do Contábil Comodo

Em 2014, eu iniciei o ano com muitas expectativas, vivendo momento de muito aprendizado na empresa que eu havia criado com outras duas pessoas e que estava avançando bem. Porém, no decorrer daquele ano tudo mudou, e a sociedade que parecia um grande sucesso e a empresa que parecia uma grande promessa acabaram se fragmentando em três outras iniciativas. Nos separamos.

O desalinhamento entre nós sobre como conduzir o crescimento gerou separação, mas foi assim que nasceu a Consense. =)

Eu já conhecia a Soraia nessa época, ela tinha feito alguns projetos em parceria com minha primeira empresa e também foi nossa cliente. Entre nós, havia um alinhamento interessante de filosofia de negócios e, curiosamente, ela também vivia um momento de dúvidas e desafios quanto ao que ela queria de fato durante o processo de sucessão do escritório de seus pais.

Enquanto a Consense estava nascendo a partir da compreensão de que ideias sozinhas não são o segredo das empresas que duram, o Contábil Comodo estava se reinventando para acolher uma nova geração e um novo futuro. 2025 marca então os 10 anos desde esse momento, uma década de Consense e meio século de Contábil Comodo.

De lá para cá, meu propósito foi apoiar pequenas e médias empresas em seu processo de crescimento e, no caminho, acabei aprendendo que crescer não é suficiente para empresas, é preciso evoluir.

A realidade revelada pelos dados

A permanência média das empresas no índice S&P 500 caiu de 33 anos (1965) para 20 anos (1990) e deve chegar a apenas 14 anos até 2026. No Brasil, a situação é ainda mais desafiadora, pois do universo de empresas abertas em 2012, seis em cada dez haviam encerrado após cinco anos.

Porte e disciplina de gestão tendem a aumentar as chances de sobrevivência. A mortalidade em cinco anos varia de 29% para MEIs até 17% para empresas de pequeno porte. Mas a sucessão continua sendo o divisor de águas, pois apenas 34% das empresas familiares declaram ter plano sucessório robusto, documentado e comunicado.

O que acontece no caminho dessas empresas que as impedem de evoluir e prosperar? Muitas delas crescem em número, pessoas e abrangência, mas de alguma forma continuam pequenas e com desafios difíceis de serem solucionados. E poucas, como revelam os números, parecem atravessar esse momento.

As dores do crescimento reveladas

Foi com essa inquietação que desenvolvemos o Estudo Consense de 10 anos, analisando diagnósticos organizacionais realizados em 80 empresas diferentes, ouvindo mais de 4.500 pessoas entre lideranças e colaboradores. O que descobrimos confirma nossa intuição: as dores mais recorrentes nas pequenas e médias empresas são estruturais, não estratégicas ou operacionais.

As cinco dores mais frequentes identificadas foram:

  1. Falta de clareza sobre papéis, funções e responsabilidades (75% das empresas);
  2. Centralização excessiva na liderança/sócios (68,8%);
  3. Ausência de processos estruturados e padronizados (62,5%);
  4. Cultura relacional/paternalista que impede decisões maduras (56,3%);
  5. Clima superficialmente positivo, mas com ruídos profundos (50%).

Essas dores não são isoladas, elas revelam padrões sistêmicos de funcionamento. A repetição desses temas ao longo do tempo e em diferentes segmentos reforça um desafio central: a dificuldade de estruturação, coerência cultural e sustentabilidade organizacional.

Ocupamos tanto nossas cabeças como empresários buscando evitar que os negócios encolham, que gastamos pouco tempo entendendo como lidar com o crescimento. Investimos tempo na elaboração da estratégia do sucesso, mas não gastamos tempo pensando a cultura e a estrutura que sustentarão esse sucesso.

Faça o download do nosso Estudo especial de 10 anos clicando aqui.

Amadurecer é diferente de crescer

Nosso estudo revelou algo fundamental: amadurecer é diferente de crescer. Empresas em estágios iniciais de crescimento tendem a operar com foco em recursos como pessoas, capital e tecnologia. À medida que amadurecem, passam a depender mais de processos e políticas e, por fim, precisam desenvolver valores sólidos e coerentes para tomar decisões complexas e evoluir estrategicamente.

Porém neste caminho, aspectos centrais e estruturais do negócio se mantém intactos, e acabam criando uma espécie de empresa grande com vícios de pequena empresa. Atrapalhando que novos estágios não apenas de crescimento, mas de maturidade organizacional se estabeleçam.

As lições do Contábil Comodo

Quando olho para o Contábil Comodo, vejo um exemplo vivo de padrões que favorecem a perenidade e a longevidade. Ao longo de 50 anos, a empresa escolheu evoluir e não apenas crescer:

  • Inovar sem perder a essência: manteve seus valores fundamentais enquanto se adaptava às mudanças do mercado contábil, incorporando tecnologia e novos modelos de relacionamento com clientes;
  • Cuidar genuinamente do cliente: desenvolveu uma reputação sólida baseada não apenas na competência técnica, mas na proximidade e confiança nas relações e não deixou isso apenas no discurso, mas reviu diversas vezes a experiência que precisava entregar para seu cliente;
  • Tomar decisões difíceis quando necessário: enfrentou momentos de escolha sobre direcionamento estratégico sem comprometer sua identidade, sobre como lidaria com as mudanças nos perfis de clientes e de funcionários. Em alguns casos optou por encolher para crescer com mais maturidade;
  • Abrir espaço para a sucessão: preparou e acolheu duas novas gerações após os fundadores, permitindo continuidade com renovação e um exuberante carinho pelas gerações fundadoras.

Esses movimentos não aconteceram por acaso. Eles refletem uma compreensão intuitiva de que a longevidade exige equilíbrio entre consistência e flexibilidade, entre tradição e inovação.

Então, qual é o segredo das empresas que duram?

Não há um único segredo, mas sim um conjunto de práticas e escolhas: empresas que duram não se sustentam apenas em números vaidosos sobre faturamento e lucro, mas em relações de confiança com todo o ecossistema, generosidade com as gerações envolvidas e um sentido compartilhado por todos.

Elas entendem que crescimento sem amadurecimento é insustentável.

O Estudo Consense confirma que apenas 13,7% das empresas analisadas atingiram notas relevantes em temas relacionados à governança e estrutura, e quase 10% apresentaram notas críticas em temas relacionados à cultura e clima. Isso indica que o problema não está na ausência de boas ideias ou na falta de dedicação, mas sim na dificuldade de materializar estratégia, cultura e estruturas maduras que sustentem e, ao mesmo tempo, evoluam, no decorrer do tempo.

A busca por equilíbrio entre cultura, estratégia e governança não é um ideal abstrato, mas uma necessidade prática para sustentar a evolução para além do crescimento. Empresas que conseguem essa proeza transformam a força de vontade, os vínculos pessoais e o conhecimento tácito em processos consistentes e valores organizacionais compartilhados.


Anderson Siqueira é fundador e educador na Consense, especialista em desenvolvimento organizacional, governança e cultura corporativa.

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