Você já deve ter conhecido diversos líderes paternalistas. Na maioria das vezes, são pessoas muito agradáveis e com a capacidade de manter relacionamentos em um estado de harmonia constante. Estes líderes também são muito competentes e costumam alcançar sucesso em seus negócios e mercados. É comum, inclusive, que em momentos de crise, tais líderes obtenham bons resultados de lealdade e engajamento.
Porém, como em tudo em nossa vida, o exagero pode entornar o caldo e atrapalhar as coisas. E, em nossa experiência, o comportamento paternal exagerado de alguns líderes pode ser uma receita perigosa quando levado a cabo por muito tempo, especialmente quando o negócio passa por dificuldades ou quando surge a necessidade de sucessão.
Separei neste artigo quatro comportamentos paternalistas que podem comprometer seriamente a capacidade do negócio de gerar resultados sustentáveis. Vale destacar que essa lista se ampara em minha vivência como consultor de desenvolvimento organizacional e se referencia na intenção geral de longevidade e sustentabilidade para um negócio.
1 – Jogar conflito para debaixo do tapete
O primeiro comportamento se baseia no fato de que, em geral, líderes paternalistas constroem seu modelo de trabalho na busca da harmonia. São líderes que acreditam que os ambientes de trabalho precisam ser calmos, que as pessoas devem se gostar sempre e onde a existência de qualquer conflito significa que os negócios vão mal. Como se fosse uma família, nutrem a aparência da harmonia a todo custo.
Tais líderes lutam com bravura extrema na eliminação desses conflitos, e o fazem de diversas maneiras, seja fingindo que eles não existem; resolvendo as desavenças de forma isolada, com conversas individuais baseadas em sua força política; ou mesmo cultivando um senso geral de que as pessoas precisam se dar bem e deixar os problemas de lado, esperando assim, que os conflitos se resolvam sozinhos com o tempo.
Cabe aqui dizer que não há problema algum em buscar harmonia, porém, na maioria das vezes, o que se conquista é uma versão falsa de harmonia, a complacência. E você sabe o que eu quero dizer com isso: um ambiente corporativo que mais parece um castelo de cartas, onde as pessoas se movimentam com cuidado para que as questões importantes não se tornem desprazeres e desafetos. Onde ninguém se compromete verdadeiramente com nada e onde as entrelinhas políticas são mais importantes do que os objetivos coletivos.
Isso é um problema por que negócios são ambientes naturalmente conflituosos e é justamente nos conflitos que nascem o comprometimento efetivo e a responsabilidade individual. Fingir que os conflitos não existem não os resolve e aumenta a possibilidade de uma verdadeira implosão do time no decorrer do tempo. E isso acontece por que a ausência de resolução transforma os conflitos em rancores e mágoas, minando as relações de forma invisível e silenciosa. Uma armadilha e tanto.
2 – Tolerância com baixa performance ou conduta antiética
Esse comportamento nocivo está muito ligado ao anterior, pois a busca por harmonia em excesso impede que líderes paternalistas confrontem alguns de seus liderados. E isso se aplica especialmente a profissionais de destaque na organização, como diretores e gerentes. Um hábito que, frequentemente, acaba por tolerar e até incentivar a baixa performance e, pior, permitir comportamentos tóxicos e antiéticos.
Esse tema se torna ainda mais sensível quando existem familiares na gestão, pois há uma tendência ainda maior de tolerância, tanto pelo laço familiar, quanto pela dificuldade de lidar com conflitos. Em minha experiência, já acompanhei diversos exemplos neste sentido, vou citar alguns:
- Lideranças com dificuldade de apontar erros em profissionais com muito tempo de casa por medo de quebrar o laço afetivo construído ou em respeito a uma espécie de “dívida” relacionada à contribuição daquele empregado para o negócio;
- Lideranças que nutrem medos profundos em relação a determinadas pessoas que se tornaram essenciais em suas empresas [grandes vendedores, gestores financeiros, especialistas técnicos], mas que o fizeram a partir de um comportamento duvidoso ou tóxico e / ou incoerente com as diretrizes oficiais;
- Líderes paternalistas com dificuldade de demitir pessoas que se arrastam por anos sem cumprir seus objetivos e resultados por conta de laços afetivos;
- Lideranças que fecham os olhos para a performance de familiares dentro do negócio, com medo de resolver tais conflitos, tornam o problema uma questão organizacional, envolvendo e estressando outras pessoas sem autonomia para resolver a questão;
- Lideranças que terceirizam a responsabilidade de confrontar comportamentos tóxicos para consultores externos ou acabam “costurando” politicamente maneiras de amenizar tais comportamentos por intermédio de outros profissionais da organização.
O problema desse comportamento não está na valorização das pessoas, mas no preço pago pela organização ao permitir que a baixa performance e o comportamento tóxico sejam tolerados. Com o tempo, eles se tornam não apenas a regra na qual as relações operam, mas representam o fracasso do discurso em relação às práticas, enfraquecem a legitimidade dos combinados e impedem que mudanças sejam implementadas.
3 – Assimetria no julgamento
Lendo até aqui você pôde notar que os comportamentos que venho citando estão completamente interligados. Nascem na dificuldade de lidar abertamente com conflitos e vão se impregnando na cultura, nas estruturas e nos modelos de gestão do negócio. Nestes momentos, é difícil perceber a origem dos problemas da organização e, muitas vezes, já existem questões de resultado que também impedem o negócio de se desenvolver.
Uma tendência das lideranças paternalistas aqui é assumir que existem pessoas e times concorrentes dentro de suas empresas, pessoas que estão de um lado e pessoas que estão de outro. Alguns destes líderes acabam por transformar seus gestores em salvadores da pátria ou em páreas do sucesso da empresa. Decidem mais com base em suas intuições e relacionamentos do que baseados em dados e estratégia.
Neste ponto, e somado aos outros comportamentos citados, o negócio acaba vivendo um ciclo permanente de silêncios ensurdecedores, pois todos percebem os conflitos e mágoas existentes, mas não os tratam e nem falam sobre eles. As reuniões são cheias de indiretas e piadas passivo-agressivas uns sobre os outros e, infelizmente, não sobra espaço para a criatividade, para o aprendizado e para a evolução.
O líder paternalista então se isola do restante da empresa, se ressentindo por ver que o “investimento” feito nas relações deveria resolver os problemas. Em algumas situações, alguns até tentam exercer o poder de uma forma desajeitada, com autoritarismos ou chantagens emocionais. O julgamento então fica comprometido.
É quando essas lideranças passam a julgar de forma assimétrica e as coisas ganham dois pesos e duas medidas, deixando difícil entender qual é a regra oficial do jogo. Sem saída, resta manter o jogo político, afastando talentos e impedindo que iniciativas importantes andem para frente. Já presenciei muitos fundadores tornarem seus negócios motivo de mais frustração do que orgulho nestes momentos.
4 – Pouca abertura para o novo
Uma vez ouvi em alguma palestra que empresas fecham não por fazer algo errado, mas por fazer o “certo” por tempo demais. Gosto dessa expressão para esse quarto comportamento, pois uma verdade importante sobre as lideranças paternalistas é que, na maioria das vezes, agem na melhor das intenções, acreditando fazer o correto.
E é justamente por isso que é tão difícil convencer líderes paternalistas a mudarem seus comportamentos. Pois muitas delas se aprisionam em suas versões de realidade, onde os problemas estão sempre fora das empresas, nos outros e nas mudanças em si. Não sei se você já assistiu ao programa “Pesadelo na Cozinha” – a versão brasileira do Hell’s Kitchen. Em um determinado episódio, um dono de restaurante é confrontado pelas inúmeras reclamações de clientes sobre a sua comida. Sua resposta representa bem este último comportamento nocivo: “Esses clientes precisam aprender a comer esse tipo de comida…”
Um líder que exagera em paternalismo tem a tendência a dificultar que seus negócios mudem. E isso acontece como um efeito colateral da busca constante pela harmonia que evita conflitos e afasta o risco a todo custo. Desta forma, sem o conflito e sem a abertura para o risco, nada muda. As coisas apenas se mantêm.
Os exemplos são inúmeros de empresas com lideranças que se empenham em segurar as relações e negócios em suas mãos, afastando as possibilidades de mudança por medo de perder o controle paternal sobre as coisas e sobre as pessoas. E, mesmo em momentos de crise, é possível perceber que tais pessoas preferem negar os problemas do que enfrentá-los.
Líderes paternalistas em busca dos conflitos que constroem
É claro que você pode identificar tais comportamentos nocivos em lideranças não paternalistas. Porém, em nossa experiência, é muito comum que líderes assim incorram no erro de tornar a harmonia um problema para o negócio. Fica então a lição de que estes comportamentos podem sabotar seriamente uma empresa, seja ela pequena, média ou grande.
A solução para esse processo de deterioração não está apenas na mudança de comportamento do líder, mas na transformação de toda uma forma de enxergar e gerir as equipes. Primeiro, é necessário abandonar o medo da desarmonia постільна білизна від виробника. Sem ele, será possível construir laços verdadeiros de confiança que permitam e incentivam a existência de conflitos importantes para o negócio. Conflitos e clareza geram comprometimento com altos padrões de excelência e cultivam no time um senso comum pela busca de resultados. Uma combinação mais adequada para a sustentabilidade e longevidade dos negócios.
Vou deixar aqui um outro artigo que escrevi recentemente sobre como iniciar transformações culturais. Caso queira continuar sua leitura, clique aqui.
Anderson Siqueira é fundador da Consense, especialista em DHO, governança corporativa e psicologia organizacional.