Sempre fui fascinado pela fascinação que o diretor Christopher Nolan tem pelo tempo. Na maioria de seus filmes, o tempo é protagonista, e nos que sobram, ele atua como um importante coadjuvante. Claro que em cada novo longa a tendência é o aprimoramento e, sem dúvida, Interestelar, é uma obra-prima. Para quem não viu, trata-se da jornada da humanidade por um novo lar, vivida por alguns pilotos e cientistas remanescentes, em uma época em que a nossa Terra já está morta. Com direito a um verdadeiro espetáculo de imagens do espaço e teorias científicas.
O filme é impactante sobre diversos aspectos: meio ambiente, humanidade, vida fora da Terra etc. Quero falar, porém, sobre o tempo e a sua realidade relativa, tomando a experiência de cada personagem como amostra. A forma como cada um viveu a mudança do tempo e a forma como cada um aprendeu e superou seus traumas, ou não, deixa claro o entendimento de que para cada um o tempo passou de forma peculiar e as decisões tomadas em relação a esta passagem selaram seus destinos.
Já escrevi sobre o tempo algumas vezes, sou apaixonado por entender a maneira como os seres humanos diferem neste sentido. O entendimento do tempo, da sua maneira exclusiva de acontecer e as decisões que tomamos perante tudo isso nos define como humanos. Ao utilizar-se da teoria da relatividade, o filme mostrou que, enquanto o tempo quase não passava para os personagens no espaço, ele era normal para quem ficou na Terra. E neste lapso de tempo, várias vidas foram perdidas, pessoas mudaram, evoluíram, amadureceram e realizaram ou não o que queriam.
O interessante é que para nós existe o entendimento de que o tempo passa para todos igualmente. Vale se questionar, porém, como seria encarar a passagem dele de maneira diferente tão claramente como no filme? E se pudéssemos viver essa experiência? Saber, hoje, como serão nossos filhos daqui a 20 anos? Viver anos em horas?
O tempo é, sem dúvida, inexorável, implacável e soberano. Ele passa, tudo muda, nada fica igual diante de sua experiência. É uma realidade física. Entretanto, o filme nos mostra como a forma de viver cada minuto é particular, individual e, mais do que isso, criadora de um mundo único para cada indivíduo. Uma espécie de quebra-cabeça da vida, em que o tempo compartilhado não é, todavia, o mesmo. Em que a vida, convivida, ainda assim, não é a mesma. Nolan, além de diversas outras coisas, nos mostrou como o tempo constrói, a cada instante, uma nova pessoa, uma nova chama de futuro para cada um. E isso não é igual para todos. Uma verdade que deixamos de lado, presos ao nosso desejo de permanência.
A esperança aqui, fica a cargo de um fio que entrelaça toda essa realidade relativa. Algo que me fez lembrar a seguinte frase de Nietzsche: “Quem tem um porquê enfrenta quase qualquer como”. No filme, esse fio está na transcendência de cada personagem, seja por um amor esquecido em algum planeta de outra galáxia, seja pelos filhos e a esperança de revê-los, seja pelo ideal da preservação da espécie humana ou seja pela preservação genuína da humanidade. Eis que no amor, como dito em um dos momentos, está o fio que entrelaça nossas realidades tão distintas, concreto, puro e na essência de compartilhar tempo e espaço.
Anderson Siqueira