Planejamento. Um dos termos mais importantes do dicionário de um negócio. Afinal, independente de seu porte, tempo de existência ou nome no mercado, qualquer negócio tende a ficar exposto à fragilidades e riscos, sem chance se sustentar diante dos desafios diários que o mercado propõe. Os últimos dois anos vieram para nos provar que os cenários podem mudar de forma drástica em pouquíssimo tempo e a bonança pode virar tempestade quando menos se espera. Segundo a CNN, com a chegada da pandemia, os pedidos de falência aumentaram 12% no Brasil em 2020 e grandes nomes como Cirque du Soleil, Latam e a rede Fogo de Chão estão na berlinda.
Porém, mesmo antes disso os empreendedores já andavam em campos minados. A pesquisa Causa Mortis do SEBRAE-SP, uma mais sólidas sobre o tema no Brasil e realizada em 2014, afirma que 55% dos entrevistados faliram por não elaboraram planos de negócios, 70% admitiu ter levado menos de seis meses planejando a abertura de sua empresa e 61% não pediram ajuda a outras pessoas ou instituições que pudessem apoiá-lo. E isso não é um privilégio apenas dos brasileiros. A agência americana Bureau of Labor Statistics (BLS), afirmou que 45% dos negócios nos EUA não chegam aos 5 anos e menos de 25% chegam aos 15, um dado constante desde o início dos anos 90. Os dois principais motivos para isso são falta de investigação do mercado e problemas no plano de negócios.
Estes números nos ajudam a afirmar: falências geralmente resultam de problemas que poderiam ter sido evitados.
Tudo muda, o tempo todo, no mundo
Canvas, 5H2W, BCG, Ansoff, Porter, OKR, PDCA, SWOT ou FOFA. A maioria desses termos possa ser familiar a maioria dos empreendedores quando o assunto é planejamento. Tem para todos os tipos, gostos, mercados e tamanhos de empresa. Porém, uma análise mais próxima permite inferir que o que tem faltado aos empreendedores não são as ferramentas e sim a ação em si. Embora a maioria de nós já saiba que planejar é mais do que estabelecer objetivos ou somar metas a esmo, poucos notamos que o modo de planejar mudou.
Foi-se o tempo onde um planejamento estratégico de 5 anos garantia estabilidade a um negócio, ou se mantinha praticamente inalterado ao longo do tempo. A era da complexidade já se estabeleceu e ao seu lado trouxe a alta interdependência, a alta conectividade e a volatilidade dos sistemas humanos e econômicos. Para navegarmos nestes novos mares, a capacidade de ler cenários complexos e responder a eles, torna-se indispensável. Daqui para a frente, planejamento é sobre estabelecer, sim, o alvo final, mas constantemente ajustar o equilíbrio da rota.
Neste sentido, quero deixar quatro provocações que podem apoiar um processo de planejamento mais conectado com o Zeitgeist que toca o mercado das pequenas e médias empresas. (Não sabe o que é Zeitgeist? Clique aqui e entenda mais. Caso já tenha ouvido falar, que tal entender mais de como isso afeta os empreendedores? Clique e confira o texto de Aluizio Falcão Filho sobre o tema na revista Exame.
Diálogo aberto
Empresas são – e, arrisco dizer, sempre serão – organismos vivos, alimentados pela qualidade dos alinhamentos e conversas existentes. É fundamental que um processo de planejamento adequado se baseie na troca de percepções dos diferentes personagens envolvidos, em todos os níveis administrativos. Afinal, cada um deles trará uma soma de informações única e indispensável para uma leitura adequada dos cenários. Vivenciar os conflitos de ideias inerentes a esses diálogos trará saúde e mais assertividade às decisões e metas.
Energia para investir na visão gerencial
Aqui fica um recado para os líderes. É impossível realizar planejamentos de valor sem uma mudança de mentalidade a respeito do que é o trabalho. Tomadores de decisão que se mantém constantemente em campos operacionais excessivos, além de perderem a oportunidade de fazerem seus times crescerem, não conseguem investir atenção e tempo para se antecipar a mudanças e riscos, coletar perspectivas e visualizar o futuro.
Estruturas e design organizacional
Por mais dedicado que seja o empreendedor, o ambiente onde ele se encontra poderá impulsioná-lo ou retê-lo. O mesmo se dá para um time de colaboradores, por mais engajado que seja. Por aqui, acreditamos que sem modelos culturais e estruturas de trabalho adequadas, toda e qualquer estratégia perde força. Na prática, as pessoas gastarão a maior parte da sua energia focando nas rotinas que permitem o trabalho e não no trabalho em si. É fundamental garantir que processos, rotinas, papeis e comportamentos esperados sejam claros e vivenciados por todos.
Aprender a reaprender
Ainda que muitos de nós ainda estejamos longe do final de nossas carreiras profissionais, devemos admitir que não fomos constantemente ensinados e treinados a sermos curiosos. Ou seja, desprendidos a ponto de saber abrir mão de conceitos que nos levaram até um ponto, mas não tem condições de nos levar adiante. Para seguir de maneira assertiva este treino deve se tornar uma prioridade em nossa tomada de decisão.
Planejar sempre será fundamental para o sucesso de qualquer iniciativa. Os números com os quais abri este texto não deixam margem para dúvidas. Ainda assim, é necessário haver intenção e disponibilidade para as reflexões internas e externas que nos fazem entender quando e de que forma devemos mudar o status quo. Não é simples, mas sempre recompensador.
Este é mais um artigo de nossa série de materiais sobre Fracassos nos negócios. Para entender mais sobre a iniciativa e ver os outros textos, clique aqui.
Camila Carvalho é jornalista, especializada em gestão, cultura organizacional e liderança 4.0 e entusiasta da educação corporativa.