O estilo cultural de uma empresa pode determinar quais serão seus resultados a curto, médio e longo prazo
Em 2015, a mídia brasileira registrou um fato interessante: o Uruguai pensava em registrar o portunhol, a mistura entre o português e o espanhol, como patrimônio imaterial do país. As estimativas apontavam que mais de 450 mil uruguaios o adotaram como língua no dia a dia, sem contar os brasileiros. Em 2018, o portunhol já se tornava conhecido como a língua das fronteiras entre Brasil e seus demais vizinhos da América Latina.
Este tipo de fenômeno acontece desde que a sociedade estava nos primeiros passos e até hoje pode nos ensinar muito sobre cultura. Os estudiosos comentam que o portunhol surgiu na necessidade de comunicação e entendimento das pessoas que transitam em um ambiente onde diferentes contextos se encontram. As pessoas que vivem na fronteira criam, organicamente, uma forma política de se conectar ao criar um código único de linguagem.
Dentro das empresas, a experiência não é muito diferente. Cada ambiente de trabalho se torna uma fronteira. Diferentes pessoas com diferentes perfis, interesses e vocabulários se cruzando todos os dias em busca de resolver problemas, cumprir planos, comprar e vender ou manter relacionamento. É aí que a cultura organizacional ganha espaço.
Assim como criar uma única língua permite a conexão entre pessoas através das palavras, a cultura organizacional carrega uma série de significados, formas especificas de tratamento e manifestação de sentimentos, momentos e emoções. A cultura garante o sentimento de unidade e pertencimento que permite a equipes alcançar resultados expressivos. Ela cria a liga entre profissionais de diferentes contextos e perfis em busca de um destino comum.
Dito isso, é importante deixar claro que toda e qualquer empresa tem uma cultura organizacional sólida e estabelecida. Onde quer que exista um grupo de pessoas reunidas, regras culturais serão estabelecidas para que a boa convivência seja preservada. O caso, especialmente nas empresas, é que nem sempre a cultura vivida é a desejada ou foi criada de forma intencional. A inércia, por si só, cria culturas não-saudáveis, porém a cultura relevante é experimentada quando analisada, discutida, planejada, medida e, acima de tudo, intencionalmente vivenciada.
Quando alguém vai a um país cuja língua não conhece, naturalmente haverá um grande empecilho de comunicação. Em uma conversa ou encontro com um nativo, pode até ser que os conceitos principais consigam chegar ao entendimento comum, mas muitas das nuances e detalhes serão perdidos. Da mesma forma, sem clareza na cultura organizacional desejada, temos conjuntos de belas frases estampadas em sites e paredes, mas que não são vividas na prática, gerando um gap de engajamento em pessoas e, por consequência, na colaboração e no trabalho em equipe.
É fundamental que cada colaborador, independente de seu nível administrativo, saiba claramente quais modos de ação são amplamente aceitos e incentivados e quais não são tolerados ou bem-vistos. E isto não é uma questão de tempo de casa. A cultura intencional bem estabelecida permite que mesmo colaboradores em tempo de experiência saibam o que é esperado deles em termos de comportamento e conduta.
Quais são os estilos culturais predominantes no seu dia a dia de trabalho?
Existem inúmeros benefícios em dar clareza da cultura que existe ou que se deseja em uma companhia. Este entendimento vem quando existem símbolos claros dos valores, condutas e comportamentos que a companhia defende e reprime. Eles serão como muretas de limite e proteção para as equipes na busca pelos objetivos empresariais.
O primeiro passo é perceber quais os estilos ou nuances culturais já estão estabelecidas no negócio e se as mesmas combinam o lugar aonde se deseja chegar. Mais uma vez, a linguagem se torna uma grande aliada. Sobre o que mais conversamos? Resultados, controles, relacionamento? Ou será que falamos sobre regras, aprendizado e segurança? Em boa parte dos casos, conversas de corredores, reuniões e apresentações estão repletas de frases, termos, gírias e brincadeiras mergulhadas na cultura atual.
Feito isso, é o momento de analisar se a cultura encontrada é a desejada. Em caso positivo, foque na manutenção intencional. Em caso negativo, o movimento consiste em analisar qual é a cultura deseja e criar um plano de ação para demonstrar os novos valores e comportamentos que serão incentivados ou desencorajados pela companhia. Cada empresa é única, portanto, deve estabelecer um modelo cultural igualmente singular, que atenda os objetivos e garanta o engajamento e conexão das pessoas dentro do ambiente.
Muitas empresas falham no processo de transição cultural por não fazerem o equilíbrio adequado entre proteção e promoção dos símbolos. Não basta apenas confrontar maus comportamentos, é preciso premiar os bons. Da mesma forma, promover entre as equipes quais são as condutas alinhadas e não gastar tempo dialogando sobre o que não é bem vindo não gerará a transformação ansiada.
A liderança tem papel essencial na busca da promoção e proteção do estilo cultural criado em uma companhia. Os exemplos dados por eles no dia a dia falarão mais alto do que qualquer carta de valores impressa. Portanto, é categórico que a alta direção da empresa inicie o processo a partir dos líderes, Afinal, quando um líder que fala a linguagem dos resultados encontra uma equipe de liderados que fala a linguagem do relacionamento, boa parte do diálogo provavelmente se perderá ao longo do caminho.
Veja que não defendo um ambiente unilateral. Resultados não estão acima de relacionamento ou vice e versa. E nós, brasileiros, entendemos isso como ninguém. O mesmo Brasil tem aipim, macaxeira e mandioca. Temos semáforo, farol e sinaleiro. Tudo isso sem deixar o português. E quando precisamos cruzar a fronteira, estamos sempre abertos a criar uma nova linguagem. Culturas saudáveis são intencionais em abraçar e combinar diferentes estilos e linguagens na busca de um produto que esteja alinhado com o principal propósito e visão de futuro da companhia.
Camila Carvalho
O que me mobiliza é o desejo de promover mudanças reais e significativas nas esferas empresariais: alinhamento e humanidade somados à resultados e consistência. Formada em jornalismo e eterna estudante curiosa de temas como liderança, design thinking, experiências de aprendizagem e MBTI®.