Tudo começou quando, em meio a um workshop, um de nossos clientes comentou sobre o ChatGPT. Segundo suas palavras, era uma nova Inteligência Artificial, que conseguia fazer um trabalho de pesquisa muito melhor e muito mais refinado do que os que temos em nosso dia a dia. E assim, como todos os curiosos, eu também quis testar. Afinal, quem não fica pensativo e querendo descobrir se a era do filme Eu, Robô (ou o livro, caso você seja mais cult) está prestes a começar, não é?
O primeiro indício do burburinho que o GPT está fazendo é que ela já chegou quebrando recordes. Uma surpreendente marca de 100 milhões de usuários ativos em apenas dois meses – o TikTok precisou de 9. O segundo é que ela está movimentando todo o mercado. Investimentos bilionários, aceleração na concorrência, hashtags nas redes sociais e tudo mais que se tem direito. Nesta semana, o Google anunciou que também terá sua própria IA e ela será chamada Bard e já estão sendo criados jeitos de integrar o chat com o whatsapp. (Obra de brasileiros, é claro. Sempre digo que a gente tem tudo pra dominar o mundo, só não queremos).
E estes são alguns dos motivos do por que esse assunto é importante para você ou para mim, mesmo que sejamos apenas reles e mortais usuários e não desenvolvedores ou especialistas em TI. Parece que o futuro da internet chegou, de novo. E talvez você, como eu, está pensando que mal se adaptou ao que existe hoje e logo terá de reaprender como viver a vida com a presença cada vez mais constante – e inteligente – dos dispositivos eletrônicos. E é verdade.
Mas vamos ao que interessa. Você quer saber como foi a conversa.
Minhas primeiras duas tentativas foram frustradas: o servidor estava fora do ar por sobrecarga – outro indicador da curiosidade das pessoas. A terceira foi a rodada de sorte. Um cadastro simples e lá estava eu diante da tela em branco. Depois “conversarmos” sobre Shakespeare e quais as melhores tonalidades para deixar uma música alegre, lancei a pergunta que estava curiosa em fazer desde o início…
ChatGPT, o que um humano pode fazer e você não pode?
Antes da resposta, um passo atrás para contextualizar quem está tendo contato com este assunto hoje. A inteligência artificial já conseguiu fazer uma redação para o ENEM em 50 segundos (com uma nota aceitável), levantar com sucesso quais são as principais tendências da moda no Brasil e no mundo, ser aprovada para um MBA da University of Pennsylvania – considerada uma das melhores escolas de negócios do mundo – além de dicas para fazer posts (e dancinhas) virais para o Instagram. Estes feitos tem colocado muita coisa em perspectiva.
Voltando… Em menos de 30 segundos, a IA trouxe a sua resposta. Decidi transcrevê-la por completo, para que possa checar por si mesmo suas habilidades:
“Como modelo de linguagem IA, eu careço de habilidades físicas e consciência, emoções, autopercepção e experiências subjetivas. Os seres humanos podem se envolver em atividades criativas como artes, música e esportes, bem como atividades que exigem resolução complexa de problemas, tomada de decisões éticas e empatia. Os seres humanos também têm a capacidade de perceber e interagir com o mundo físico de maneiras que eu não posso. Além disso, os seres humanos têm a capacidade de crescer, aprender e mudar ao longo do tempo, de maneiras que não são possíveis para mim como modelo IA.
Em seguida, questionei: O que é único no trabalho humano?
Os seres humanos trazem qualidades únicas para o seu trabalho, incluindo criatividade, inteligência emocional, adaptabilidade e capacidade de trabalhar em equipe. Os seres humanos têm capacidade de empatia e conexão emocional que lhes permite formar fortes relações com seus colegas e clientes, o que pode levar a resultados mais produtivos e bem-sucedidos. Eles também têm a capacidade de tomar decisões com base em ética e princípios morais, e têm um impulso para melhorar e inovar constantemente. Essas qualidades tornam o trabalho humano distinto e frequentemente resultam em resultados difíceis de replicar com inteligência artificial ou automação.
Parece chover no molhado, mas não é. Se estamos envolvidos no mundo corporativo, já ouvimos isso em algum momento. Nada pode superar o elemento humano. Ainda assim parecemos esquecer disso, já que muitas vezes, consciente ou inconscientemente, estamos alimentando ambientes de trabalho que não ensinam pessoas a trazerem à mesa aquilo que faz e fará diferença no futuro do trabalho: suas mentes, não somente suas mãos. Reduzimos cenários complexos, não induzimos à visão sistêmica ou ao pensamento analítico. O dia a dia, a correria, os resultados de curto prazo sobrepondo os de longo. Alimentamos competitividades nocivas ao invés de somarmos forças. Voltamos com freqüência ao modelo do homem-objeto, embora a própria tecnologia tente nos empurrar para fora disso.
Em tempos como este, não tenho receio de dizer que tudo o que precisar de reforma, inevitavelmente virá à luz: a maneira que estudamos, nos comunicamos, determinamos o que é importante, organizamos nossa vida e, é claro, trabalhamos. Assim como é verdade que estas tecnologias chegaram para ficar e, em pouco tempo, mudarão nossa realidade de novo, é verdade que novas perguntas complexas virão e apenas a capacidade humana de aprender, reaprender, adaptar, conectar e cultivar poderá pavimentar um futuro saudável. De fato, muitas profissões passarão – fora aquelas que já estão passando – por grandes transformações. E, aos poucos e boas iniciativas, os avanços chegarão até as periferias da sociedade.
Ao final, escrevo este causo e reflexão – a primeira do ano para a Consense – como um convite e uma pequena provocação. 2023 ainda está começando. Ainda está em tempo de tomarmos uma decisão de priorizarmos o desenvolvimento do que nos fez e nos faz únicos como espécie: nossa capacidade de criar, sonhar, projetar, aprender e reaprender, quantas vezes forem necessárias. Escolha desenvolver sua maneira de se comunicar, colaborar e liderar (a si mesmo e aos demais, quando a oportunidade surgir). O escritor William Gibson ficou famoso por dizer que “o futuro já chegou, só ainda não está devidamente distribuído”. Cabe a nós nos dispor ao máximo para que, quando bater em nossa porta, estejamos preparados para ele.
Camila Carvalho é jornalista, especializada em gestão, cultura organizacional e liderança 4.0 e entusiasta da educação corporativa.