Temos visto aumentarem as rodas de discussão sobre comportamentos de liderança que promovem ambientes de trabalho tóxicos. E, recentemente, em uma de nossas reuniões aqui na Consense, discutimos um pouco sobre um perfil mais “discreto” de liderança, que a despeito de suas intenções muito positivas, pode gerar um ambiente de trabalho muito tóxico e prejudicial. Trata-se daqueles líderes que tentam implantar na empresa ou equipe uma lógica de família e amizades, em vez de uma lógica de trabalho propriamente dito.
É comum que estes líderes sejam calmos e parcimoniosos ou mesmo muito alegres e sociais. E, embora tais traços não tenham problema algum, o que percebemos residir nas entrelinhas é uma busca constante de harmonia, alegria, calma e / ou tranquilidade. E aqui reside o primeiro problema, pois esta tentativa, logo de cara, tende a impedir que discussões importantes aconteçam em benefício do negócio.
Isso é um problema por que o conflito não é algo ruim. E mais, é muito importante que o próprio líder seja aquele que provoca e incentiva conflitos que levem a equipe a produzir algo de melhor qualidade. Não se trata, claro, de brigas e falta de respeito, mas todo time precisa de algum atrito e calor para gerar fagulhas interessantes em termos de ideias e boas decisões.
Sem conflitos, as equipes não se comprometem e nem evoluem seu modo de pensar. E acabam se tornando mesmo como famílias, mas daquelas onde já não se cabe mais o esforço para progredir, apenas se mantém o status quo. Sem inovação e mudança. Inclusive, quero deixar aqui a indicação de um artigo nosso sobre comprometimento para se aprofundar.
Permissividade e politicagem na empresa
Outro traço comum deste líder é a permissividade com comportamentos políticos e com foco em vantagens pessoais. Em geral, este líder tolera demais o mau desempenho e, em alguns casos, até aceita comportamentos não muito éticos por medo de lidar com os conflitos inerentes à luta para resolvê-los. Por este motivo, a tendência é o cultivo de um ambiente onde reina a lógica de “quem grita mais” ganha, ou a de que quem consegue estabelecer relações mais próximas com este líder se dá melhor no trabalho também.
Uma pena para o negócio, que amarga em decisões mais baseadas em pessoalidades e politicagem do que nos critérios técnicos que demandam cada uma delas. Líderes assim são ausentes e fracos em garantir que valores fortes sejam vividos. Inseguros, aceitam a bajulação como moeda de troca e permitem que aqueles que atendam suas vontades sejam os protagonistas do time.
Ambientes assim cultivam relações baseadas em politicagem, vantagens e egoísmo. Pouco contribuem para o desenvolvimento dos integrantes da equipe e, muito menos, para o negócio. Lideranças ausentes não configuram regras firmes para o jogo e permitem que aqueles que percebem esse vácuo deem às cartas. Você já deve ter visto por aí equipes com lideranças fantasmas, ou seja, lideradas por aqueles que ocuparam o vazio deixado pelo líder de fato.
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Mas eu nem sabia que podia ser diferente
Isto não significa que um ambiente de trabalho precise ser truncado e pouco alegre. Muito menos que uma liderança precisa sempre ser forte e totalmente dura com resultados e processos. A questão é equilibrar as coisas em um formato que entregue resultados ao mesmo tempo que permita a expressão natural e potente das pessoas e das relações.
É possível viver em um ambiente que foque em resultados e seja bom para as pessoas. É possível criar relações de confiança fortes, que gerem estados emocionais propícios à aprendizagem e inovação ao mesmo tempo em que se cobra a meta do mês e se fale aquilo que desagrada. Mas, de fato, não é buscando ser uma família que isso vai acontecer. Por que empresa não é família, nem grupo de amigos.
Já conheci líderes excelentes em marcar happy hour e praia com o time, mas fracassarem na hora de conduzir um feedback corretivo. Ou mesmo líderes que sabiam conversar sobre qualquer assunto com sua equipe, mas mal sabiam distribuir o trabalho a ser feito pelas pessoas. E este é o ponto central, o desequilíbrio.
E o que fazer para a empresa não ser uma família?
Na maioria das vezes, ambientes que tentam ser famílias possuem líderes ausentes de suas funções, pouco honestos consigo e com seus times e com uma incapacidade sistemática de lidar com conflitos e situações difíceis. E a organização, na maioria das vezes, é a responsável por não formar seus líderes de forma equilibrada e correta. Acreditam numa espécie de osmose da aprendizagem – como se líderes se tornassem líderes de forma natural…
O primeiro passo para evitar esse tipo de ambiente tóxico em sua empresa é refletindo se você mesmo não é o líder que ativa esse tipo de comportamento. Caso você seja o principal executivo do negócio, é fundamental olhar para si e checar se você mesmo não é aquele que dá os recados equivocados que orientam as suas lideranças e equipes na direção errada. Uma reflexão desafiadora, mas fundamental.
Em seguida, busque compreender que um excelente profissional não é, automaticamente, um bom líder e que ao promover uma pessoa ao papel de líder ela se torna também um indivíduo em estágio inicial de aprendizagem naquela nova função. O que demanda treinamento, mentoria, apoio e acompanhamento adequado para cumprir o novo papel. Lideranças são formadas, não nascem prontas.
Por fim, considere refletir sobre qual é o perfil de liderança que sua empresa precisa e deseja. Compreenda que liderar é um papel funcional dentro da organização e, por este emotivo, reflete um conjunto de habilidades, rotina e valores específicos para cada nível e estagio de liderança. Não se trata de preferências pessoais aqui, mas um equilíbrio entre o que se espera da liderança como papel e os traços individuais de cada profissional.
A família é uma instituição linda e tem seu lugar, que certamente não é dentro das empresas. Cuidado.
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Anderson Siqueira é CEO e fundador da Consense educação para as relações, especialista em psicologia organizacional e governança corporativa.