
Tudo começou quando decidi fazer um detox de Instagram entre julho e agosto. É minha principal (talvez única) rede social ativa. Explico: me sinto muito velha para o TikTok, muito nova para o Facebook de hoje em dia, pouco criativa para o Twitter, ou melhor, X – nem vamos comentar o Threads – e pouco disciplinada para o LinkedIn. Então, ficaria apenas com o WhatsApp liberado para uso.
Foi aí que os sintomas FOMO começaram.
O primeiro, foi a sensação de vazio de não saber o que fazer quando pegava o celular para um momento de descompressão e não achar o aplicativo. Era como se o cérebro, mesmo conhecendo minha decisão mais recente, buscava no hábito o processo mais confiável. Porém, isso passou com o avançar dos dias. O pior veio depois: a sensação persistente de estar de fora, desinformada e desconectada das pessoas que conheço e do mundo ao redor.
E novamente, minha mente me pregou peças. Embora eu saiba que na prática, a desinformação e a desconexão eram apenas da plataforma – as principais notícias do mundo e da sociedade ainda estavam chegando via outros canais; embora eu não esteja comentando os stories de ninguém, minhas principais conexões reais continuavam firmes e fortes – a sensação era de estar no desconhecido. E tudo isso era muito desconfortável.
O diagnóstico era claro. Eu estava experimentando FOMO.
O medo de ficar de fora é uma experiência naturalmente humana
O autodiagnóstico gerou em mim uma imensa vontade de escrever (e entender um pouco mais) sobre o assunto. Li alguns artigos, assisti alguns Ted Talks para conseguir compreender mais a fundo o que significa então esse tal de Fear of Missing Out que, em tradução livre, significa o medo de ficar de fora das coisas. Uma sigla pra descrever essa sensação ruim de ansiedade que se instala em nós quando temos a sensação de que estamos não estamos incluídos no que está acontecendo de relevante, seja individual, local ou globalmente.
A primeira coisa que aprendi foi que essa experiência parece nova, mas na verdade não é. Dizem as (más) línguas históricas que quando o estadista e filósofo romano Marco Túlio Cícero (106-43 a.C.) não estava em Roma, garantia que qualquer novidade chegasse até ele por carta, para evitar o medo de não saber de alguma movimentação, fosse ela política ou não. Com certeza, algum jovem em 1840 experimentou FOMO ao descobrir que seus amigos foram a um evento que ele não foi convidado. O medo de estar de fora faz parte de nossa existência como sociedade, pois toca em questões extremamente humanas e pessoais como a comparação, o medo de não ser amado, significativo ou de não deixar um legado que será lembrado, mesmo quando não estivermos mais aqui.
Porém, foi em 2000 que esse conjunto de sensações e sentimentos recebeu um nome. E olha que nem foi em estudos acadêmicos de psicologia ou sociologia. O estrategista de marketing Dan Herman escreveu no Journal of Brand Management sobre o poder de venda dos slogans que apelavam para este medo da exclusão social. Aos poucos o termo foi virando moda, enquanto ressoava nas pessoas. Em 2012, uma pesquisa feita pela agência de publicidade J. Walter Thompson apurou que sete em cada dez millennials (nascidos entre 81 e 96) já haviam experimentado algo do tipo. Quatro deles admitiam que a sensação era frequente.
O crescimento exponencial da tecnologia, a chegada das redes sociais e o aumento massivo de seu uso ano após ano e o acesso às informações em apenas minutos fazem com que esse sentimento seja potencializado de formas a nos prejudicar. A realidade online estimula estes instintos como nunca antes foi visto e estamos todos aprendendo a lidar com mais um “novo normal”. Já é sabido pela maioria de nós, ainda que superficialmente, que as interações e métricas das redes sociais geram em nós estímulos que liberam hormônios como dopamina (recompensa), serotonina (bem-estar), oxitocina (amor) e adrenalina (estresse). Existem especialistas que afirmam que relações compulsivas com as redes podem se equivaler à vícios químicos. Portanto, se não administrado adequadamente, o FOMO pode intensificar quadros de ansiedade, depressão, compulsividade e perda da qualidade de vida.
Inclusive, para você, líder, vale entender mais sobre o mundo em que vivemos hoje, em termos de mudança e incertezas. Temos um artigo especial sobre Liderança 4.0 e sua importância neste momento de mundo. Para ler, clique aqui.
Cinco minutos para limpar a caixa de entrada
Que temos de lidar como o FOMO também em nossas rotinas de trabalho não é novidade para ninguém. Mas, engana-se quem pensa que a única forma de vermos o fenômeno no horário comercial são as pequenas (ou grandes) escapadas que damos diariamente para checar as notificações do Instagram, o novo vídeo de gatinhos que saiu no YouTube ou o WhatsApp do grupo da família. Nossos canais de comunicação corporativa também pode ser uma grande fonte de tensão.
Convido você a parar e analisar:
- Quantas vezes já passou pela sua mente a sensação de que não pode deixar de olhar a caixa de entrada de e-mails frequentemente ou perderá alguma informação que necessita de uma resposta “urgente” ou “imediata”? (Coloco entre aspas por que o significado destas palavras gera inúmeras imaginações e estresses desnecessários no trabalho, mas isso é pauta para outro dia…)
- Quantas vezes você checa a rede de comunicação interna no meio de tarefas quando uma notificação aparece (ou alguém aparece em sua mesa), quebrando seu fluxo de concentração, por ter o sentimento de que líderes, pares ou liderados iriam entrar em colapso se não os respondesse em menos de 5 minutos?
- Quantas vezes, como líder, você não delegou tarefas que já poderiam ter saído de suas mãos por ter receio de não receber informação adequada sobre o andamento ao invés ajustar os processos de comunicação?
O medo de perder algo por nos desconectarmos atinge seriamente os níveis de produtividade que podemos alcançar. Sintomas como excesso de distrações e falta de foco, decisões impulsivas e sobrecarga de trabalho, dificuldades de colaboração e estresse podem ser potencializados pelo FOMO. Muitos de nós nos sentimos vitimizados pelas pessoas ao nosso redor por parecer que são elas quem não nos permitem concentrar e fazer o trabalho que foi requerido com excelência e tranquilidade, porém, devemos ser igualmente críticos em analisar se temos feito os alinhamentos internos e externos necessários com nossos grupos de trabalho.
Dica: Uma maneira interessante de buscar equilibrar o FOMO e a concentração é utilizar compartimentos de tempo para cada uma de suas atividades. A técnica pomodoro é um excelente modelo deste uso. Veja mais sobre ela aqui.
De FOMO para JOMO
“Você me convenceu, Camila. FOMO pode ser um problema. Mas, o que podemos fazer para resolver isso?”.
Os especialistas afirmam que, por sua natureza, o FOMO não pode ser completamente eliminado. Teríamos de suprir as interações pessoais para evitá-lo de forma plena. Porém, existem algumas recomendações, corporativas e pessoais que podem ajudar a equilibrar mais este jogo e evitar ansiedade excessiva:
- Busque manter perspectivas realistas sobre as coisas: ninguém consegue fazer tudo, conhecer tudo, estar a par de tudo;
- Dê clareza sobre seus prazos e carga de trabalho para as pessoas que se relacionam contigo no trabalho;
- Estipule limites saudáveis, inclusive para os tempos de respostas, sabendo quando dizer não;
- Aprenda a negociar quando necessário, especialmente quando se trata de seus tempos de foco e concentração;
- Valorize qualidade acima de quantidade: priorize estar a par daquilo que realmente agrega valor a quem você e ao que você faz
E caso você tenha se reconhecido neste artigo recomendo este artigo. Ele tem dicas práticas que considerei úteis para aprender a lidar com o FOMO e suas possíveis consequências. A expectativa é que nós – você, que me lê neste momento, e eu e as pessoas ao nosso redor – sejamos bem sucedidos em perseguir um caminho com mais equilíbrio e, quem sabe, chegar a uma nova sigla: JOMO, joy of missing out ou a alegria de estar de fora. JOMO, que surgiu como um contraponto ao FOMO, é conseguir alimentar o desejo por conexão sem perder a alegria de viver o momento presente. É saber que, por estarmos imersos no aqui e no agora, estamos perdendo, sim, outras realidades, mas que isso não é e nem será um problema.
E, agora, Camila? Voltou para as (outras) redes sociais?
Ainda não. Não me impus nenhum tipo de regra como fiz quando comecei o detox, mas, ao mesmo tempo, não senti vontade. Minha conta está ativa e consigo acesso pelo navegador quando preciso ou quero, mas nada me impeliu a voltar a fazer o download do aplicativo de forma permanente. O amanhã a Deus pertence (risos).
Tem coisas que ainda fico sabendo com um certo atraso, admito. Exemplo: por morar na grande São Paulo e não precisar sair da região naquele dia, passei a terça da greve dos metroviários sem mal saber do caos que estava acontecendo na cidade por conta das estações fechadas. Nem sempre fico sabendo de alguns eventos que gostaria com antecedência e por vezes me coçam os dedos de não poder repostar os vídeos e fotos em que meus amigos me marcam. Porém, o sentimento é muito mais pacífico. Já estou em JOMO? É muito cedo pra dizer, mas FOMO e eu estamos entrando em uma temporada de paz.
Um forte abraço,
Camila Carvalho é jornalista, especializada em gestão, cultura organizacional e liderança 4.0 e entusiasta da educação corporativa
Outros links para ler sobre o assunto:
The Fear of Missing Out: Priya Parker at TEDxCambridge 2011 – apenas em inglês